quarta-feira, dezembro 19, 2007

Perspectiva

Ela me aprisionou. E não somente porque minha respiração, meus humores e as batidas do meu coração agora dependem das fases da lua de seu signo – o que já seria motivo suficiente para o uso tópico de terapias, álcool, religiões e outras drogas pesadas. Ela me aprisionou o olhar, estou sob sua perspectiva, a mercê dos seus gostos, em função das suas opiniões: o vinho com a carne, o sapato com a meia, a barba por fazer, o modelo de óculos escuros, o filme, a peça de teatro, o grupo de rock, os temperos da salada... E mais: a beleza de certos corpos, a vulgaridade de certas mulheres, a falta de bares especializados em drinks no Rio de Janeiro e a importância de um pouco de água do pote de azeitona na preparação de um bom martini.
Penso em me despedir gentilmente e sair de sua vida, ou desaparecer à francesa, mas são só pensamentos que nada mais fazem alem de me corroer na madrugada. Diante dela, tais pensamentos são mais inofensivos que um poodle.

Mas há um lobo adormecido, eu não me engano. Ontem mesmo senti uma de suas unhas me arranhar o estômago.

sexta-feira, dezembro 14, 2007

Fotografia

Debaixo de uma chuva constante; num bairro residencial; numa rua de pouco movimento; ia um homem numa bicicleta.
Na garupa, uma menina em roupa de escola, segurando um guarda-chuva preto. Agarrada à cintura do homem, a menina mantinha o guarda-chuva mais para a cabeça dele do que para seu próprio corpinho magro, que assim, não só recebia as gotas de lama atirados pela roda traseira da bicicleta, como também as muitas gotas que vinham do céu.
Agarrada à cintura do homem, com o rosto colado em suas costas, a menina sorria.